"Em uma toca no chão vivia um Hobbit"
- Allan Dionisio
- 4 de mai.
- 3 min de leitura
Atualizado: 23 de jul.
Ao terminar a leitura de O Hobbit, não é difícil perceber que a história de Bilbo Bolseiro não é apenas uma aventura fantástica. É, antes de tudo, uma parábola sobre a transformação interior que todo cristão é chamado a viver.
Bilbo Bolseiro começa sua jornada como muitos de nós: confortável, tímido, fechado em sua rotina. Seu mundo é o Condado — verde, previsível, seguro. Mas então chega Gandalf, com sua vara, seu olhar penetrante e seu convite incômodo: sair.
Aceitar a jornada não é simples. Bilbo resiste. Afinal, quem em sã consciência aceitaria caminhar com treze anões rumo a uma montanha infestada de perigos e guardada por um dragão? Mas a vida espiritual é parecida. Deus, como Gandalf, muitas vezes nos propõe saídas que parecem absurdas. Ele nos chama a deixar o pequeno para descobrir o grande. Mas só compreendemos isso no caminho.
Logo surgem os gobelins, símbolo dos ataques das trevas — aquelas forças que nos assaltam de dentro e de fora. Depois, os wargs, os lobos que cercam e ameaçam, nos lembrando que há momentos em que parecemos encurralados, como em certas noites da alma. E aí vêm as águias — essas intervenções que não esperamos, como a graça de Deus que nos resgata no momento certo, quando já não vemos saída.
A travessia da floresta negra é lenta e cheia de ilusões, como a vida em tempos de aridez espiritual. Os viajantes se perdem, veem luzes falsas, ouvem vozes — até que aprendem a confiar menos em si e mais na providência. No coração da floresta, Bilbo encontra o anel. Não sabe ainda o que ele representa, mas é ali que começa uma virada: o pequeno hobbit, que mal sabia usar uma faca, começa a tomar decisões, a liderar, a proteger.
E Smaug, o dragão, representa a avareza, o orgulho, o poder que corrompe. Mas Bilbo não se deixa dominar por isso. Ele entra no covil, mas não se contamina. Ao contrário, seu gesto de entregar a pedra do Arken para tentar a paz entre os povos mostra que ele já não busca glória ou tesouro, mas reconciliação. Ele sai transformado — e essa é a verdadeira conquista.
Ao voltar, Bilbo descobre que o mundo não o reconhece mais. E isso também é muito cristão. Quem verdadeiramente trilha o caminho da conversão acaba por não caber mais nos moldes antigos. Os outros acham estranho, zombam, não entendem. Mas quem caminhou com anões, enfrentou dragões e foi salvo por águias sabe que há coisas mais importantes que a opinião alheia.
Tolkien, com sua imaginação moldada pela fé católica, nos oferece uma história que fala à alma. Não porque pregue diretamente, mas porque nos coloca diante das escolhas mais profundas: coragem ou medo? Verdade ou comodismo? Renúncia ou poder?
O Hobbit é, no fim das contas, uma narrativa sobre como Deus age silenciosamente em nossas aventuras. Mesmo quando não é nomeado, Ele está lá — na figura de Gandalf que reaparece na hora certa, nas águias que salvam, na luz que vence as sombras da floresta. E nos mostra que a verdadeira jornada começa quando aceitamos sair de nós mesmos.





O Hobbit é um clássico!
Cara, que texto bom! Nunca tinha feito essa ligação entre a história e a nossa caminhada espiritual.